“Cessa tudo que a antiga musa canta que outro valor mais alto se alevanta”. O autor destes versos, mesmo tendo um só olho, enxergava muito. Exposto o verso, vamos hoje de reviravoltas. Aquelas repentinas guinadas que mudam a rota, o andamento, o destino, de maneira inesperada, de um segundo pra outro. Isso quer dizer também que poderemos mudar de assunto abruptamente. Pode ser que hoje seja assim... sintam-se avisados.
Esse tipo de argumento é muito utilizado e dizem que causa impacto numa história. Syd Field, considerado um dos maiores “script doctors” de Holywwod, escreveu em 1979 o livro: “Manual do Roteiro”. Para ele “todo drama é conflito. Sem conflito não há personagem; sem personagem; não há ação; sem ação; não há história; e sem história não há roteiro”. E os “plot points”, ou as reviravoltas, são essenciais para manter o interesse do leitor, espectador ou ouvinte.
Syd Field, Mr. Plot Points |
odete Roitman mô...rreu |
Não é querer desmerecer o autor e o livro que, inclusive, faz parte da nossa humilde biblioteca. É que o buraco é bem mais embaixo. Ora, não é nenhuma novidade a técnica apresentada. A estrutura aristotélica do drama, que era praticada na Era Cristã, passeava por aí.
O drama é dionisíaco |
Mas essa conversação toda, de escrever e criar para prender/vender, assegurar o interesse do público, significa concessão. O artista, então, deve se submeter a isso, desprezando a liberdade criativa e centrando-se nos fins comerciais ou mercantilistas? Ao se praticar essa suposta fórmula de sucesso, incorre-se num aspecto limitador, onde a vala comum serve para todos. Há um nivelamento mediano, para não dizer medíocre, para onde todos vão. Essa estratégia serve bem para o entretenimento, mas na arte ela é castradora. A imprevisibilidade que torna tudo mais emocionante, seja na vida real ou na ficção, vai pra onde? Pro bebeléu!
Field valeu para Laura Esquivel em "Como água para chocolate" |
Um filme, peça de teatro ou livro, cá pra nós, não deve ter sua qualidade mais notória nos rumos da história que é narrada. É na narrativa, na forma como a história é contada, onde o artista, o verdadeiro artista, vai mostrar seu talento e sua capacidade empreendedora lidando com ferramentas como a inspiração e a disciplina. Regra é coisa fora de moda. Cada um assiste o que quer e se diverte e alimenta a alma da forma que achar mais adequada.
Estrutura do drama grego e shaskespereano, segundo Gustav Freytag |
"Reviravolta" de Oliver Stone |
Viver é viver com o imprevisível. E não é fácil. Gente muito louca gosta disso, ou finge que gosta, ou não pensa no futuro. Não é segredo pra ninguém que planejar a vida gera resultados mais confortáveis. Mesmo que a sensaboria venha junto. Mas... o inesperado existe, acontece e causa reviravoltas que podem ser boas, outras nem tanto e outras muito ruins. Perder um vôo por besteira dá uma raiva danada, mas ao saber que foi salvo por esse inesperado contratempo... é um alívio, é nascer de novo. Uma diverticulite, no presidente que ia tomar posse faz o país cair em mãos inesperadas. E aí fica a instigante pergunta: “e se...” “e se...” “e se...” Aí, seria outra história.
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