Vista de Cuiabá, Dalva de Barros (1966) |
As praças públicas eram o que são hoje os shopping centers, as boates, os barzinhos. As cidades nasceram a partir das praças. Difícil de acreditar e impossível de negar: as metrópoles se construíram e se estabeleceram a partir de uma praça, seu umbigo, para dali se irradiar as ruas, vias, malhas, conjuntos residenciais e comerciais, bairros, distritos, o tal do tecido urbano.
Em Cuiabá não foi diferente. Os cuiabanos(as) das antigas sabem o valor que esses espaços embrionários representaram para a sociedade nas décadas de 50 e 60. Era ali onde aconteciam os grandes negócios (compra e venda de terras, fazendas, gado...), política e politicagem e principalmente onde corria solto os disque-me-disque da cidade (a fofoca, a maledicência). Nenhum fato sucumbiu ao poder da praça, ela era rádio, TV e jornal, por e através dela a notícia se difundia, à toda.
Coreto, palco da praça |
Nos finais de semana era o palco do flerte, da sedução (muito recatada) e do galanteio. As moças, em turma, rodam a praça à procura de um casamento; os rapazes, também em turma, rodam em sentido contrário, em busca de farra, de se mostrar (coitados, estão à beira de um namoro, noivado seguido de casamento).
Praça Alencastro |
Destaques das praças: O coreto, local onde bandas da polícia e exército se apresentavam sob o a batuta do Mestre Albertino, e a fonte luminosa (linda, colorida) espargindo minúsculas gotas de água, refrescando o já famoso calor cuiabano e o calor da bacurinha. Naqueles tempos não havia essa história de “chapinha” e o “burrifo” da fonte não “estrovava” o penteado da mulherada. Ah, pipoqueiro e fotógrafo também eram figurinhas carimbadas. As Praças Alencastro, Ipiranga e da República eram os points. Creio que devia de ter distinção social, não sei.
Praça da República e o Gogó da Ema |
Praça Ipiranga |
Nos anos setenta, quando a rivalidade entre Cuiabá e Campo Grande era ferrenha e tudo era um Estado só, um cuiabano, para justificar que Cuiabá era melhor que Campo Grande, saiu com esta, carregando no sotaque: “Campo Grande não tem nem jardim pra gente passear”.
Os fatos que relatamos não chegamos a vivenciar. São histórias que nos contaram. Quando chegamos a Cuiabá a moda era ir à missa, depois ao Cine Theatro, Bandeirantes ou Tropical, um sorvete no Seror e depois ir ao Bar do Beto, a sensação do momento. Mas isso já é outra história.
O Centro Histórico de Cuiabá. O escoamento da nossa história pelo ralo segue firme por esse pedaço mais antigo da cidade. O cheiro do ralo, aquele bom filme, tem a ver com o que presenciamos ao caminhar por essa região urbana. Durante o dia, até que passa. O comércio forte e o formigueiro humano meio que mascaram a feiúra e sujeira do lugar e a incapacidade do poder público de organizar aquilo ali.
Centro Histórico |
Mas, a partir do lusco fusco, tudo se transforma para pior. Ontem precisamos caminhar por ali, por volta das 19h30. Dá até medo e a possibilidade de ser assaltado não é desprezível. Se você quer um lugarzinho pra petiscar, bebericar um chopinho ou um sorvete, que seja, não tem. Uma padaria para comprar algo, necas de pitibiriba. Só o que tem são táxis e ônibus pra você se mandar dali. O único que ainda resiste bravamente é o pipoqueiro.
Lembro-me que entre 2005 e 2006, algumas iniciativas foram feitas para revitalizar o pedaço. Um projeto, o “Siriri na Praça”, trazia grupos de cultura popular para se apresentar numa pracinha ali no final da Cândido Mariano, todas as quintas ao final da tarde. Cheguei a ver gringos e transeuntes parados e apreciando o folguedo com gosto. Os cuiabanos antigos chegavam a se emocionar com a coisa. Claro que o projeto não teve sequência.
Fico pensando quando chegar a Copa do Mundo de 2014, mas a Fátima sugeriu que não fossemos por esse lado. Gostou mais quando eu disse que uma cidade, assim como os seres humanos, precisa envelhecer com dignidade.
Centro Histórico desmoronando |
Claro que os tempos são outros e voltar pro passado é coisa daquela antiga série de TV, “Túnel do Tempo”. Mas o respeito e o cuidado com o pedaço que foi o embrião desta terra, desta cidade calorenta, é bom e a gente gosta. Não é mesmo, bugrada??!!
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