terça-feira, 21 de junho de 2011


Vista de Cuiabá, Dalva de Barros (1966)

As praças públicas eram o que são hoje os shopping centers, as boates, os barzinhos. As cidades nasceram a partir das praças. Difícil de acreditar e impossível de negar: as metrópoles se construíram e se estabeleceram a partir de uma praça, seu umbigo, para dali se irradiar as ruas, vias, malhas, conjuntos residenciais e comerciais, bairros, distritos, o tal do tecido urbano.

Em Cuiabá não foi diferente. Os cuiabanos(as) das antigas sabem o valor que esses espaços embrionários representaram para a sociedade nas décadas de 50 e 60. Era ali onde aconteciam os grandes negócios (compra e venda de terras, fazendas, gado...), política e politicagem e principalmente onde corria solto os disque-me-disque da cidade (a fofoca, a maledicência). Nenhum fato sucumbiu ao poder da praça, ela era rádio, TV e jornal, por e através dela a notícia se difundia, à toda.

Coreto, palco da praça

Nos finais de semana era o palco do flerte, da sedução (muito recatada) e do galanteio. As moças, em turma, rodam a praça à procura de um casamento; os rapazes, também em turma, rodam em sentido contrário, em busca de farra, de se mostrar (coitados, estão à beira de um namoro, noivado seguido de casamento).

Praça Alencastro

Destaques das praças: O coreto, local onde bandas da polícia e exército se apresentavam sob o a batuta do Mestre Albertino, e a fonte luminosa (linda, colorida) espargindo minúsculas gotas de água, refrescando o já famoso calor cuiabano e o calor da bacurinha. Naqueles tempos não havia essa história de “chapinha” e o “burrifo” da fonte não “estrovava” o penteado da mulherada. Ah, pipoqueiro e fotógrafo também eram figurinhas carimbadas. As Praças Alencastro, Ipiranga e da República eram os points. Creio que devia de ter distinção social, não sei.


Praça da República e o Gogó da Ema


Praça Ipiranga 

Nos anos setenta, quando a rivalidade entre Cuiabá e Campo Grande era ferrenha e tudo era um Estado só, um cuiabano, para justificar que Cuiabá era melhor que Campo Grande, saiu com esta, carregando no sotaque: “Campo Grande não tem nem jardim pra gente passear”.

Os fatos que relatamos não chegamos a vivenciar. São histórias que nos contaram. Quando chegamos a Cuiabá a moda era ir à missa, depois ao Cine Theatro, Bandeirantes ou Tropical, um sorvete no Seror e depois ir ao Bar do Beto, a sensação do momento. Mas isso já é outra história.

O Centro Histórico de Cuiabá. O escoamento da nossa história pelo ralo segue firme por esse pedaço mais antigo da cidade. O cheiro do ralo, aquele bom filme, tem a ver com o que presenciamos ao caminhar por essa região urbana. Durante o dia, até que passa. O comércio forte e o formigueiro humano meio que mascaram a feiúra e sujeira do lugar e a incapacidade do poder público de organizar aquilo ali.



Centro Histórico

Mas, a partir do lusco fusco, tudo se transforma para pior. Ontem precisamos caminhar por ali, por volta das 19h30. Dá até medo e a possibilidade de ser assaltado não é desprezível. Se você quer um lugarzinho pra petiscar, bebericar um chopinho ou um sorvete, que seja, não tem. Uma padaria para comprar algo, necas de pitibiriba. Só o que tem são táxis e ônibus pra você se mandar dali. O único que ainda resiste bravamente é o pipoqueiro.

Lembro-me que entre 2005 e 2006, algumas iniciativas foram feitas para revitalizar o pedaço. Um projeto, o “Siriri na Praça”, trazia grupos de cultura popular para se apresentar numa pracinha ali no final da Cândido Mariano, todas as quintas ao final da tarde. Cheguei a ver gringos e transeuntes parados e apreciando o folguedo com gosto. Os cuiabanos antigos chegavam a se emocionar com a coisa. Claro que o projeto não teve sequência.

Fico pensando quando chegar a Copa do Mundo de 2014, mas a Fátima sugeriu que não fossemos por esse lado. Gostou mais quando eu disse que uma cidade, assim como os seres humanos, precisa envelhecer com dignidade.



Centro Histórico desmoronando

Claro que os tempos são outros e voltar pro passado é coisa daquela antiga série de TV, “Túnel do Tempo”. Mas o respeito e o cuidado com o pedaço que foi o embrião desta terra, desta cidade calorenta, é bom e a gente gosta. Não é mesmo, bugrada??!!


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