Escritablog |
O jornalismo cultural possibilita que a gente conheça e se aproxime dos artistas. O jornalista que atua nessa área e realmente é interessado, evolui, aprende muito e também tem o privilégio de fazer amizades com pessoas mais sensíveis e inteligentes. Não é pecado rotular artistas dessa forma. Foi assim que conheci o mineiro de Cataguazes, Luiz Ruffato, escritor expoente da nova geração literária brasileira. Quer dizer, primeiro, li alguns de seus livros e gostei muito.
Em 2008, um amigo jornalista, o Pitolé, me procurou para armar uma entrevista com Ruffato. Pitolé foi colega de classe de Ruffato há muitos anos, lá nas Gerais. Minha conversação com Ruffato está reeditada aqui nesta postagem, mais abaixo. Vale a pena dar uma olhada.
Nesta terça (21/12), dando uma conferida nos mails, eis que registro um do Ruffato, solicitando apoio a uma revista literária, criada por Wladyr Náder, um dos principais responsáveis pelo chamado boom da literatura brasileira na década de 1970. Náder tocou a revista chamada Escrita e chegou a perder patrimônio pessoal para alimentar o sonho de abrir espaço para os novos. “Foi assim naquela época (entre 1976 e 1988, com interrupções) e... continua assim até hoje... Agora, ele está à frente da versão eletrônica da revista Escrita... Convido você a visitá-la, divulgá-la, colaborar com ela...”, escreveu Ruffato em seu mail. O endereço da revista é http://escritablog.blogspot.com/
Última capa da versão impressa |
“Revista literária de prestígio, disposta a descobrir talentos, oferece suas páginas a escritores imaginosos e de fino estilo. Não é preciso ser bonito ou bonita, ter dinheiro ou vestir-se com bom gosto. Capricho só no texto. Poetas e ficcionistas são bem-vindos, sem distinção.” Esse texto está na página inicial do blog e também era o lema da revista impressa. Vai lá e manda bala. Sei que muitos amigos escritores passeiam pelo Tyrannus e garanto que isto é assunto do nosso interesse, especialmente, já que é um espaço literário coletivo, inclusive, para novos talentos.
ENTREVISTA
Escritor de carteirinha
Mineiro de Cataguazes, o escritor Luiz Ruffato é uma das mais gratas revelações recentes da literatura brasileira. Dono de um estilo próprio, onde experimenta inovações na narrativa, e demonstrando um pleno domínio de texto, o autor vem conquistando alguns dos mais importantes prêmios literários brasileiros. Bom de conversa, como costumam ser os mineiros, Ruffato respondeu com sinceridade as questões que lhe encaminhamos, via e-mail.
Diário de Cuiabá - Ruffato, sua biografia registra uma origem humilde onde a acessibilidade a uma formação cultural que desencadeie o surgimento de um escritor sofisticado não tende a ser comum, embora essa colocação cheire ao preconceito. Sei lá. Mas, fale-me de como a literatura surgiu em sua vida e de como seu pai (pipoqueiro) e sua mãe (lavadeira) influenciaram na sua opção profissional.
Luiz Ruffato - Nasci numa família sem nenhuma cultura formal. Meu pai era semi-analfabeto, minha mãe analfabeta. Em minha casa não tínhamos, obviamente, livros, a não ser a Bíblia, já que meu pai, numa altura da vida, converteu-se, tornou-se crente, como se dizia, ou se diz, e acabou diácono de uma igreja pentecostal, a Maranata. No entanto, meus pais tinham absoluta certeza de que a única maneira de nós, os filhos, conseguirmos alguma coisa na vida seria através dos estudos. E nunca mediram esforços para que estudássemos. Então, através de nossos esforços, eu e meu irmão nos formamos no Senai, em tornearia-mecânica. Infelizmente, meu irmão morreu moço, com 26 anos. Minha irmã, como era praxe naquela época, abandonou logo os estudos, casou... Eu continuei batendo cabeça, fui pra Juiz de Fora trabalhar, acabei me interessando em continuar os estudos, fiz Comunicação na Universidade Federal de Juiz de Fora...
DC - O engajamento social dos artistas costuma retumbar numa patrulha ideológica implacável. Mas há exemplos de criadores geniais, cuja biografia, nem sempre se pauta no politicamente correto. Você tem uma opinião formada sobre essa questão?
LR - Não me importo em ser politicamente correto ou não. Importo-me em deixar claro de que lado estou. O problema é que hoje os escritores preferem não ter opinião a respeito de nada. Prefiro conversar com um sujeito conservador, que se declara conservador, do que com um sujeito que não sei o que pensa. Se é que pensa. O que fica, sem dúvida, é a obra do escritor. Mas o escritor também é um cidadão. E enquanto ele é vivo, penso, tem um compromisso com seu tempo, a que não pode furtar.
DC - Sua escrita apresenta características inovadoras. Você tem se mostrado um autor libertário, propenso a burlar convenções e quebrar regras narrativas. A tipologia e outros aspectos gráficos, gramaticais etc, são tratados sem muita cerimônia em sua literatura. Por quê isso? É algo mais racional ou apenas um fluxo de consciência estiloso?
LR - Eu escrevo racionalmente. Todas as minhas decisões são baseadas em opções pensadas e pesadas. Evidentemente, alguma coisa sempre foge ao modelo, senão eu não seria humano, mas máquina. Mas escrever é trabalhar. E trabalhar com afinco. Não acredito em inspiração.
DC - Sua produção literária registra experiência no terreno da poesia. Isso é coisa do passado, ou podemos esperar novos versos de Ruffato futuramente?
LR - O meu livro de poemas, As máscaras singulares, embora publicado em 2002, é anterior a Histórias de remorsos e rancores, editado em 1998. Ocorre que, num determinado momento, percebi que a poesia que buscava poderia ser absorvida na prosa. O que tento hoje é fazer uma prosa de ficção que tem um pé enterrado na poesia. Agora, é claro, há coisas que nem mesmo essa maneira de escrever prosa dá conta... Portanto, quem sabe, num futuro distante, posso pensar em poesia novamente...
DC - Você, imagino, lê bastante. Tem preferências? Vai mais de ficção, filosofia, poesia etc?
LR - Eu tenho sempre um livro na cabeceira da minha cama - pra hora de dormir - e um outro no escritório, pra quando preciso dar uma parada para descansar... Leio de tudo, mas minhas preferências sempre recaem sobre poesia, história, filosofia, ensaios literários e prosa de ficção. Mas gosto muito de ler sobre física, geografia...
DC - Luiz Ruffato é um escritor bastante premiado. Que ganhou prêmios importantes na literatura nacional. É até traduzido para outros idiomas. Imagino que, por conta disso, você fatura pelo menos uma ‘merrequinha’ em nível de direitos autorais. Ou será que você engrossa a fileira dos escritores que dizem que é impossível viver apenas de literatura?
LR - Em abril completam-se cinco anos que eu deixei o jornalismo pela literatura. E não me arrependo. Eu vivo de literatura, tenho casa, mulher, filhos, gatos e gastos... Tudo quem paga é a literatura. Não os direitos autorais, mas tudo o que existe em torno dos livros, palestras, festivais, prefácios, orelhas, leituras críticas, etc. Tenho muito orgulho disso, de ser um escritor profissional num país como o Brasil.
DC - E o futuro do Brasil, politicamente falando. Você acredita em algo ou alguém que possa reverter a nossa sorte?
LR - O Brasil existe apesar dos políticos, apesar da classe dirigente, apesar da nossa burguesia predatória, apesar de tudo...
DC - Última pergunta: Quando você ouve falar de Mato Grosso, de Cuiabá, qual ou quais são as primeiras coisas que lhe vêm à cabeça?
LR - Calor. E um desejo muito grande de conhecê-la.
Diário de Cuiabá - Ruffato, sua biografia registra uma origem humilde onde a acessibilidade a uma formação cultural que desencadeie o surgimento de um escritor sofisticado não tende a ser comum, embora essa colocação cheire ao preconceito. Sei lá. Mas, fale-me de como a literatura surgiu em sua vida e de como seu pai (pipoqueiro) e sua mãe (lavadeira) influenciaram na sua opção profissional.
Luiz Ruffato - Nasci numa família sem nenhuma cultura formal. Meu pai era semi-analfabeto, minha mãe analfabeta. Em minha casa não tínhamos, obviamente, livros, a não ser a Bíblia, já que meu pai, numa altura da vida, converteu-se, tornou-se crente, como se dizia, ou se diz, e acabou diácono de uma igreja pentecostal, a Maranata. No entanto, meus pais tinham absoluta certeza de que a única maneira de nós, os filhos, conseguirmos alguma coisa na vida seria através dos estudos. E nunca mediram esforços para que estudássemos. Então, através de nossos esforços, eu e meu irmão nos formamos no Senai, em tornearia-mecânica. Infelizmente, meu irmão morreu moço, com 26 anos. Minha irmã, como era praxe naquela época, abandonou logo os estudos, casou... Eu continuei batendo cabeça, fui pra Juiz de Fora trabalhar, acabei me interessando em continuar os estudos, fiz Comunicação na Universidade Federal de Juiz de Fora...
DC - O engajamento social dos artistas costuma retumbar numa patrulha ideológica implacável. Mas há exemplos de criadores geniais, cuja biografia, nem sempre se pauta no politicamente correto. Você tem uma opinião formada sobre essa questão?
LR - Não me importo em ser politicamente correto ou não. Importo-me em deixar claro de que lado estou. O problema é que hoje os escritores preferem não ter opinião a respeito de nada. Prefiro conversar com um sujeito conservador, que se declara conservador, do que com um sujeito que não sei o que pensa. Se é que pensa. O que fica, sem dúvida, é a obra do escritor. Mas o escritor também é um cidadão. E enquanto ele é vivo, penso, tem um compromisso com seu tempo, a que não pode furtar.
DC - Sua escrita apresenta características inovadoras. Você tem se mostrado um autor libertário, propenso a burlar convenções e quebrar regras narrativas. A tipologia e outros aspectos gráficos, gramaticais etc, são tratados sem muita cerimônia em sua literatura. Por quê isso? É algo mais racional ou apenas um fluxo de consciência estiloso?
LR - Eu escrevo racionalmente. Todas as minhas decisões são baseadas em opções pensadas e pesadas. Evidentemente, alguma coisa sempre foge ao modelo, senão eu não seria humano, mas máquina. Mas escrever é trabalhar. E trabalhar com afinco. Não acredito em inspiração.
DC - Sua produção literária registra experiência no terreno da poesia. Isso é coisa do passado, ou podemos esperar novos versos de Ruffato futuramente?
LR - O meu livro de poemas, As máscaras singulares, embora publicado em 2002, é anterior a Histórias de remorsos e rancores, editado em 1998. Ocorre que, num determinado momento, percebi que a poesia que buscava poderia ser absorvida na prosa. O que tento hoje é fazer uma prosa de ficção que tem um pé enterrado na poesia. Agora, é claro, há coisas que nem mesmo essa maneira de escrever prosa dá conta... Portanto, quem sabe, num futuro distante, posso pensar em poesia novamente...
DC - Você, imagino, lê bastante. Tem preferências? Vai mais de ficção, filosofia, poesia etc?
LR - Eu tenho sempre um livro na cabeceira da minha cama - pra hora de dormir - e um outro no escritório, pra quando preciso dar uma parada para descansar... Leio de tudo, mas minhas preferências sempre recaem sobre poesia, história, filosofia, ensaios literários e prosa de ficção. Mas gosto muito de ler sobre física, geografia...
DC - Luiz Ruffato é um escritor bastante premiado. Que ganhou prêmios importantes na literatura nacional. É até traduzido para outros idiomas. Imagino que, por conta disso, você fatura pelo menos uma ‘merrequinha’ em nível de direitos autorais. Ou será que você engrossa a fileira dos escritores que dizem que é impossível viver apenas de literatura?
LR - Em abril completam-se cinco anos que eu deixei o jornalismo pela literatura. E não me arrependo. Eu vivo de literatura, tenho casa, mulher, filhos, gatos e gastos... Tudo quem paga é a literatura. Não os direitos autorais, mas tudo o que existe em torno dos livros, palestras, festivais, prefácios, orelhas, leituras críticas, etc. Tenho muito orgulho disso, de ser um escritor profissional num país como o Brasil.
DC - E o futuro do Brasil, politicamente falando. Você acredita em algo ou alguém que possa reverter a nossa sorte?
LR - O Brasil existe apesar dos políticos, apesar da classe dirigente, apesar da nossa burguesia predatória, apesar de tudo...
DC - Última pergunta: Quando você ouve falar de Mato Grosso, de Cuiabá, qual ou quais são as primeiras coisas que lhe vêm à cabeça?
LR - Calor. E um desejo muito grande de conhecê-la.
Ruffato rufando |
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