Ponte sobre o rio Cuiabá (Jared Aguiar, 2000) |
Tomar banho de rio já foi um bom programa para fugir do escaldante calor cuiabano. Os rios Cuiabá e Coxipó recebiam famílias inteiras, turmas de todas as partes, gente de todas as classes sociais nos finais de semana e feriados, num passado nem tão distante assim. E como era divertido. Até os anos 80, em determinadas épocas, quando rio não tava muito vazio e nem correndo demais, era comum a gurizada pular da ponte velha, aquela onde deságua a avenida XV de Novembro.
Lembro-me que essa pulação da ponte gerou até pauta na TV Centro América. A repórter chegou para entrevistar a gurizada e viajou na pergunta: “Quando você pula da ponte, você cai?”. Quando a água tava assim meio turva, barrenta, outra brincadeira era mergulhar para o outro mergulhar em seguida tentando te achar. Essa brincadeira era chamada de “sambô”.
Lembro-me que essa pulação da ponte gerou até pauta na TV Centro América. A repórter chegou para entrevistar a gurizada e viajou na pergunta: “Quando você pula da ponte, você cai?”. Quando a água tava assim meio turva, barrenta, outra brincadeira era mergulhar para o outro mergulhar em seguida tentando te achar. Essa brincadeira era chamada de “sambô”.
Mas, além de pular da ponte e do sambô, pescar era outra grande diversão. A ponte ficava apinhada de gente com vara na mão (epa!!!), vara de pescar mesmo!!!. E quem passava ia logo perguntando: Tá pegando hoje? O que? Pegar uma pirapuntanga era coisa que dava um status danado. Piraputanga é peixe ladino, esperto pra catiça e não se deixa fisgar facilmente. Conforme a época do ano, a isca variava. Com as águas bem limpas, transparentes, pescava-se a piraputanga com pinhão, uma frutinha pequena e seca, escura e bem leve. Era preciso ter uma técnica apropriada, porque a linhada era grande e não tinha chumbada. Com movimentos diferentes em cada braço, e muita coordenação, arremessava-se o pinhão devidamente enfiado no anzol a uma distância de cinco ou mais metros. Um movimento plasticamente bonito e cheio das ciências, que nem o de jogar a tarrafa.
As praias de Santo Antonio do Leverger eram concorridíssimas nos finais de semana. Cuiabá inteira se mandava pra lá na segunda metade dos anos 70. A juventude chamava Leverger de “Santos”. Outra coisa que se fazia muito, era lavar carro, caminhonete e caminhão na beira do rio. Era coisa natural, ninguém se importava muito com isso não!
A cuiabanada melhor, o matogrossense, sempre gostou muito de água: de rio, de açude, baía. As casas cuiabanas tinham depósitos de água (caixas dágua) e quase todo mundo tomava banho, com caneca, latas, pelado no quintal, a céu aberto, uma delícia. Os depósitos de água nos quintais eram como um pedaço de rio que se trazia pra casa. Botavam até peixe dentro, acho que prá água ficar com mais jeito de água de rio... Naqueles tempos, tinha muito mais afinidade com o Rio de Janeiro. E quem era de família mais abastada ia estudar no Rio ou passar o verão por lá.
Banho no Rio Coxipó (Inst. Histórico e Geográfico de MT) |
Enchente (Inst. Histórico e Geográfico de MT) |
Acostumados com banhos de rio, os cuiabanos, quando iam às praias cariocas pela primeira vez, cometiam algumas gafes como levar sabonete, toalhas de rosto. Os mais velhos recomendavam aos filhos que não mergulhassem de ponta porque, debaixo d’água, poderia haver algum toco e seria perigoso bater com a cabeça nele. Sei do caso de uma moça que, acomodada nas areias de Copacabana, disse que queria sentar-se mais longe do mar, porque estava “burrifando” água. E que falou que areia era areia? Areia, pros cuiabanos, era terra. Outro cuiabano, dizem, reclamou do banho de mar porque na praia não tinha sarã pra pendurar as roupas. Um primo meu, quando foi conhecer o mar, no Rio, a primeira coisa que fez foi experimentar o gosto da água... “Hummm, tem gosto de azeitona”.
Hoje já não é mais assim. Perdemos um lazer acessível para todo mundo. Não se vê mais gente tomando banho no rio, pulando da ponte, pescando com vara. Às vezes um aqui, outro acolá. Com essas lembranças e esse saudosismo, no qual a gente sempre acaba recaindo, vamos encerrando a edição. E, de japa (ou de lambuja), um belo poema de Ivens Scaff, legítimo cuiabano, criado no bairro do Porto, sobre um tempo que era assim...
Ponte Julio Muller (Inst. Histórico e Geográfico de MT) |
Fim da infância
De casa em casa, ia o Capitão
o próprio Capitão do Porto
com sua farda branca impecável
os meninos sorrateiros, atrás
que novidade era aquela,
o que teriam aprontado daquela vez
Não tinham subido sem permissão
nas lanchas ancoradas
Não tinham pulado da ponte,
quanto mais do arco da ponte
Não tinham furtado piraputanga de nenhum jacá
Educadíssimo o Capitão do Porto
esclarecia às famílias do Porto
Educadíssimo o Capitão do Porto
farda de imaculada brancura
que seus filhos não deveriam tomar
mais banhos de rio nus
A maioria já tinha pentelhos
Não ficava bem
Gostei muito!
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