terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Criaturas e filme estranhos


Íamos conversando sobre o filme “Tio Boonmee que se lembra de suas vidas passadas”, ganhador da Palma de Ouro, de 2010 quando a conversa descambou para a figura mitológica do Mapinguari, criatura vivente das florestas.


O Mapinguari é descrito como uma criatura de aproximadamente dois metros de altura; tem o corpo recoberto por longos pelos que o tornam invulnerável à balas; os pés são de burro, virados para traz; as mãos possuem garras imensas; a boca se abre na vertical e vai do peito até a barriga; e exala um cheiro horrível (mistura de fezes e carne podre). Seu único ponto fraco é o umbigo. Segundo gente que já o viu, filmou e ouviu seus berros (que é parecido com o dos caçadores), ele é terrível e sanguinário. Mata as pessoas e as despreza devorando-lhe somente a cabeça.





David Oren, ornitólogo americano, ex-diretor do renomado Museu Goeldi, acredita na existência da criatura. Ouviu centenas de pessoas que não conseguiram chegar mais perto da criatura porque ficaram desnorteadas pelo seu fedor.  Oren diz que o Mapinguari pode ser um fóssil vivo que habita algum lugar da densa floresta amazônica, uma preguiça gigante, parente das atuais, que foram extintas a mais de 10.000 anos.



Mas o que tem a ver o filme “Tio Boonmee que se lembra...” com o nosso Mapinguari? O ambiente, sem dúvidas... É um filme que fala de pessoas que vivem na floresta tropical e que têm familiaridade com os seres que nela habitam. E aí, pode ser que culturas diferentes, gente de origens diferentes, se aproximem nesse mundo fantástico.  Sendo a Tailândia um país de ambiência tropical, naturalmente, há pontos em comum com o Brasil. Em “Tio Boonmee...”, volta e meia, seres estranhos ou animais surgem em cena com a mesma força de personagens humanos. Por exemplo, o “Macaco Fantasma”, que era parente do Tio Boonmee e por opção virou bicho do mato e vive com seu bando na floresta. O Macaco Fantasma lá dos tailandeses, ninguém tira da nossa cabeça, é o nosso Mapinguari, daqui. Criatura que em Mato Grosso também é conhecida como Pé de Garrafa.




Dirigido por um cineasta de nome complicado (queria o quê, o sujeito é da Tailândia, complicado é alguém se chamar Zé, lá pras bandas da Tailândia), não vamos ousar dizer aqui que o filme é chato. Quer dizer, é chato num certo sentido, mas... vamos pular essa parte. O que não dá pra negar é que a técnica de Apichatpong Weerasethakul é perfeita. Escreveu e dirigiu seu filme, com uma narrativa que passeia pelo onírico, o espiritual e o filosófico, naquele ritmo devagar quase parando. Andaram dizendo que o filme ganhou a Palma de Ouro da chatice, num ano em que Tim Burton presidiu o júri.





As imagens são de babar. O cineasta, pelo que entendemos, fez um passeio pela cultura tailandesa e contrapôs valores tradicionais com o moderno e com a ocidentalização, mas sem nunca abrir mão das raízes culturais daquele país do oriente.



Numa certa altura do filme, surgiu um comentário: “Porque que filmes brasileiros não vencem em Cannes”. Erro. O Brasil já nhapou a Palma de Ouro, sim senhor, com “O Pagador de Promessas” (1962).






2 comentários:

  1. Ei vocês dois aí. Finalmente viram o melhor filme do ano passado, hein? Meio chato? eheheh. O nosso querido Joe (sim, qdo começou a ganhar prêmios e ser reconhecido no Ocidente resolveu facilitar as vidas e sugeriu que o chamassem por Joe - acertaram qdo falaram em Zé, portanto, lá no texto) é o maior cineasta da atualidade: ou dos três maiores, vá lá. Desde que surgiu com Mal dos Trópicos, vindo na sequência com o Síndromes e Um Século (para não falar dos curtas e de seu trabalho com experimentações audiovisuais), criou uma novidade no tratamento narrativo, com um simples "evidenciar" da naturalidade que o budismo deles impõe no seu dia-a-dia, no seu viver, transportado para a telona. Para eles a reencarnação, os espíritos que vagueiam, a transposição da alma que se transfere para um animal de outra espécie, e "otras cositas encrencadas", não são consequência de atitudes divinas superlativas e opressoras, ou vaticinadoras, mas de um "Deus" que é a natureza onde vivem, ou os bichos que os cercam. O que ele tem feito é um cinema que "simplesmente" conta a relação amistosa e natural deles com essa complementação que é o seu Deus e a sua religião. Na realidade, é a velha confirmação da genialidade brotando da não pretensão, da simplicidade. Tenho textos pro Síndromes e pro Tio Boonmee (inclusive para o curta Tio Boonmee) lá no site, qdo tiverem tempo a perder... Beijos e abraços. Cid Nader

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    1. Pois é Cid, quando dissemos que o filme é chato não quer dizer que não nos rendemos aos seus encantos. Gratos pelas informações enriquecedores sobre Joe/Zé. Beijos

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