Na transmissão do Oscar o crítico de
cinema Rubens Ewald Filho deu uma tropeçada no vernáculo pátrio. Ao comentar um
filme usou a expressão “artesões”, para referir-se ao plural de artesão. É um
erro muito comum. Nem todos sabem que a forma correta seria “artesãos”. Mas, tudo
bem. Artesãos e artesões são quase que a mesma coisa, né? Deixa pra lá. A mesma
coisa, uma ova. Vai lá e olha no dicionário o que significa um e outro. Vai
não: artesãos é o plural de artesão, enquanto artesões é o plural de artesão (um
outro artesão), que significa aquele enfeite tipo uma moldura usado em tetos e
abóbadas. Agora, abóbadas... se não souber o que significa, vai lá no Google, ou
no dicionário. Depende do seu nível de alergia.
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Artesãos trabalhando |
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Artesões ornando |
Esse nosso idioma é mesmo
complicado. Outra ocorrência curiosa. Se
alguém se referir a um trabalho seu como incipiente, aceite a crítica e tente
melhorar. Mas se algum canalha classificar seu trabalho como insipiente, parta
para a porrada imediatamente. Pô, esse cara tá te xingando de ignorante.
Portanto, sai pro tapa com ele e faça jus à acusação. Quando me perguntam sobre
a maldita crase e suas regras mirabolantes, repletas de exceções (palavra boa
pra grafar errado), respondo que uso-a por intuição. Acho que seria melhor
dizer que uso a crase na base do chutômetro. É por que quando erro na crase,
significa que minha intuição não anda lá essas coisas. Será que falha essa tal
de intuição? Sei lá... embananou geral.
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Ronaldo, o felômeno |
Professor Omar Rodrigues de Almeida,
hoje juiz, deu aula de língua portuguesa na antiga Escola Técnica, pra muitas gerações.
Gostava das aulas dele, especialmente, as de literatura. Certa vez, cobrou-nos inventividade
na escrita, mesmo que na redação comercial. Passou-nos a tarefa de redigir
ofícios com textos criativos. Um colega surgiu com o seguinte preâmbulo: “Venho
através deste ilustre pergaminho...”. Parecia a escolinha do Professor Raimundo
ou o cara foi escrevinhador de Pedro Pero Vaz de Caminha?
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Esses caciques têm cacife! |
Ainda nos tempos da Escola Técnica.
Tivemos um professor de física que apresentava suas teorias mais ou menos
assim: “Suponhamos que um corpo teje em movimento e que sua massa seje de...”.
Em nossa última viagem de férias combinávamos com o guia de turismo (ou seria
guia turístico?) a respeito do horário da partida para o passeio do dia
seguinte. Ele foi taxativo: “Nós temos que tar às oito horas”.
“Célebro”. Você já tinha “ouvisto”
(junção dos verbos ouvir e ver, acreditamos) alguém se referir à massa cinzenta
dessa forma? Acho que até celebridades cometem
esse erro de vez em quando, já que celebridade deve ser uma derivação de “célebro”,
porque (este porque seria junto ou separado?) celebridades quase sempre são pessoas muito inteligentes. Ah... e tem Cérbero também, mas isso é outra
história e entra aqui só pra ilustrar o post.
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Cérbero tem três célebros ou cérebros? |
“E agora vamos receber o
cineastra...!”. Confesso que presenciei um mestre de cerimônias apresentar, para
um auditório lotado, o convidado especial da noite. Cineastra, deduzo, deve ser
aquele diretor de cinema que também é um astro. De outra feita, há muitos anos,
o cerimonial se referiu a um ilustre personagem como “balaústre da cultura
regional”. Balaústre, claro, é a mistura de baluarte com ilustre. Me passou
agora pela cabeça se ilustre não teria a ver com lustre, aquelas armações que
sustentam lâmpadas. Pula essa parte...
Tropeços na fala e/ou na escrita,
quando partem de crianças são engraçados. E perdoáveis. A gente costuma dar menas
(uiiii, essa é dolorosa!) importância pra eles. Conheço um sujeito que já
passou dos 50 e que, na infância, chamava armário embutido de “armário em
butique”. Tem a ver. “Lentes de compacto”, outra pérola. Foi uma garotinha que escreveu
numa redação quando tinha uns oito ou nove anos. Sei de um gurizinho lá trocou
a igreja Santuário das Almas, por Sanitário das Almas. Deve ter pensado que as
almas ficam “apertadas” e precisam se aliviar.
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Em nível de ilustração estamos a nível do mar... |
Houveram, verbo haver no plural? Cuidado com ele gente
boa. É um perigo. E pra encerrar essa conversa, confesso aqui que estou quase
desistindo de falar da maneira que dizem ser a correta em relação a “em nível
de” e “a nível de”. Com certeza!
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Paiê, é braguilha ou barguilha? |
A propósito, a calhar, existe a pérola "Micóbrio, o Dançarino Infeliz", do Grupo Rumo (álbum "Quero Passear", de 1988):
ResponderExcluirQuantos bichos será que a terra tem?
- Milhões, milhões muito mais de cem.
Eu sei que tem bicho de todo tamanho
E de tudo que é jeito
Tem uns que são muito terríveis
Tem outros que são imprevisíveis
Mas aqueles totalmente invisíveis
Eu nunca vi
Ou melhor, eu nunca tinha visto
Porque um dia antes de dormir eu ouvi um ruído
De bicho pequeno, miúdo, desses que a gente nem vê.
Ele voava mas não era pernilongo
Ele piscava mas não era vaga-lume
Nem formiga, pulga, carrapato, nem piolho
Mas dançava... o quê?
Sapateava, virava, fazia um pas des deux
Impressionante!
Tão impressionante que fui chegando perto pra ver
Eu estava morrendo de medo
(Será que ele morde?)
Ele era um bicho esquisito
Pequeno e miúdo e tão feio que só podia ser um desses micóbrios
Micóbrio?
(Vai ver que é parente de cocodrilo.)
Micó...cró...có...cró...bio
Era um micróbio sim
Um bicho difícil até de enxergar
Com uma calça blue jeans
Um bicho difícil até de explicar
Meia de lã, um lenço de cetim
E de repente ficou olhando pra mim
Com uma cara de choro que dava dó
Sem falar no susto que eu levei
Quando ele abriu a boca e disse:
Ele me disse que ele era muito triste
E que dançava mesmo só pra aparecer
E era feio, careca, baixinho e muito barrigudo
E chorava.... ave maria!
Soluçava, gemia
Inacreditável!
Tão inacreditável que fui ficando desconfiado.
Ôpa!
Ele tava querendo me enganar
(Será que ele queria te pegar?)
Ah! Então eu esmaguei o bicho num pirex
E deixei ele pregado na parede com uma fita durex.
Não conhecíamos essa música. Mas tem uma antiga do grande Cartola, "Fiz por você o que pude", que num determinado verso: "Jesus me premeia". Outros versos do cancioneiro popular brasileiro exploram com ironia ou singeleza os tropeços na língua: "A gente somos inútil" (em "Inútil", do Ultraje a Rigor), ou "Eu vou de liforme branco, eu vou" (em Maracangalha, de Dorival Caymmi).
ResponderExcluirPra não falarmos de toda a obra do "mestre singelo", Adoniran Barbosa, né?
ResponderExcluirE o que dizer então das famosas chamadas da GloboNews, GNT e congêneres: aos 15 minutos da madrugada de sábado para domingo. Só mesmo na tv globo é que tem madrugada de um dia para o outro.
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