segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Tropicões com a língua

Na transmissão do Oscar o crítico de cinema Rubens Ewald Filho deu uma tropeçada no vernáculo pátrio. Ao comentar um filme usou a expressão “artesões”, para referir-se ao plural de artesão. É um erro muito comum. Nem todos sabem que a forma correta seria “artesãos”. Mas, tudo bem. Artesãos e artesões são quase que a mesma coisa, né? Deixa pra lá. A mesma coisa, uma ova. Vai lá e olha no dicionário o que significa um e outro. Vai não: artesãos é o plural de artesão, enquanto artesões é o plural de artesão (um outro artesão), que significa aquele enfeite tipo uma moldura usado em tetos e abóbadas. Agora, abóbadas... se não souber o que significa, vai lá no Google, ou no dicionário. Depende do seu nível de alergia.   

Artesãos trabalhando

Artesões ornando
Esse nosso idioma é mesmo complicado.  Outra ocorrência curiosa. Se alguém se referir a um trabalho seu como incipiente, aceite a crítica e tente melhorar. Mas se algum canalha classificar seu trabalho como insipiente, parta para a porrada imediatamente. Pô, esse cara tá te xingando de ignorante. Portanto, sai pro tapa com ele e faça jus à acusação. Quando me perguntam sobre a maldita crase e suas regras mirabolantes, repletas de exceções (palavra boa pra grafar errado), respondo que uso-a por intuição. Acho que seria melhor dizer que uso a crase na base do chutômetro. É por que quando erro na crase, significa que minha intuição não anda lá essas coisas. Será que falha essa tal de intuição? Sei lá... embananou geral.

Ronaldo, o felômeno
Professor Omar Rodrigues de Almeida, hoje juiz, deu aula de língua portuguesa na antiga Escola Técnica, pra muitas gerações. Gostava das aulas dele, especialmente, as de literatura. Certa vez, cobrou-nos inventividade na escrita, mesmo que na redação comercial. Passou-nos a tarefa de redigir ofícios com textos criativos. Um colega surgiu com o seguinte preâmbulo: “Venho através deste ilustre pergaminho...”. Parecia a escolinha do Professor Raimundo ou o cara foi escrevinhador de Pedro Pero Vaz de Caminha?

Esses caciques têm cacife!

Ainda nos tempos da Escola Técnica. Tivemos um professor de física que apresentava suas teorias mais ou menos assim: “Suponhamos que um corpo teje em movimento e que sua massa seje de...”. Em nossa última viagem de férias combinávamos com o guia de turismo (ou seria guia turístico?) a respeito do horário da partida para o passeio do dia seguinte. Ele foi taxativo: “Nós temos que tar às oito horas”.

“Célebro”. Você já tinha “ouvisto” (junção dos verbos ouvir e ver, acreditamos) alguém se referir à massa cinzenta dessa forma?  Acho que até celebridades cometem esse erro de vez em quando, já que celebridade deve ser uma derivação de “célebro”, porque (este porque seria junto ou separado?) celebridades  quase sempre são pessoas muito inteligentes.  Ah... e tem Cérbero também, mas isso é outra história e entra aqui só pra ilustrar o post.  

Cérbero tem três célebros ou cérebros?

“E agora vamos receber o cineastra...!”. Confesso que presenciei um mestre de cerimônias apresentar, para um auditório lotado, o convidado especial da noite. Cineastra, deduzo, deve ser aquele diretor de cinema que também é um astro. De outra feita, há muitos anos, o cerimonial se referiu a um ilustre personagem como “balaústre da cultura regional”. Balaústre, claro, é a mistura de baluarte com ilustre. Me passou agora pela cabeça se ilustre não teria a ver com lustre, aquelas armações que sustentam lâmpadas. Pula essa parte...

Tropeços na fala e/ou na escrita, quando partem de crianças são engraçados. E perdoáveis. A gente costuma dar menas (uiiii, essa é dolorosa!) importância pra eles. Conheço um sujeito que já passou dos 50 e que, na infância, chamava armário embutido de “armário em butique”. Tem a ver. “Lentes de compacto”, outra pérola. Foi uma garotinha que escreveu numa redação quando tinha uns oito ou nove anos. Sei de um gurizinho lá trocou a igreja Santuário das Almas, por Sanitário das Almas. Deve ter pensado que as almas ficam “apertadas” e precisam se aliviar.

Em nível de ilustração estamos a nível do mar...

Houveram,  verbo haver no plural? Cuidado com ele gente boa. É um perigo. E pra encerrar essa conversa, confesso aqui que estou quase desistindo de falar da maneira que dizem ser a correta em relação a “em nível de” e “a nível de”. Com certeza!

Paiê, é braguilha ou barguilha?

4 comentários:

  1. A propósito, a calhar, existe a pérola "Micóbrio, o Dançarino Infeliz", do Grupo Rumo (álbum "Quero Passear", de 1988):



    Quantos bichos será que a terra tem?
    - Milhões, milhões muito mais de cem.

    Eu sei que tem bicho de todo tamanho
    E de tudo que é jeito
    Tem uns que são muito terríveis
    Tem outros que são imprevisíveis
    Mas aqueles totalmente invisíveis
    Eu nunca vi
    Ou melhor, eu nunca tinha visto
    Porque um dia antes de dormir eu ouvi um ruído
    De bicho pequeno, miúdo, desses que a gente nem vê.

    Ele voava mas não era pernilongo
    Ele piscava mas não era vaga-lume
    Nem formiga, pulga, carrapato, nem piolho
    Mas dançava... o quê?
    Sapateava, virava, fazia um pas des deux
    Impressionante!
    Tão impressionante que fui chegando perto pra ver
    Eu estava morrendo de medo
    (Será que ele morde?)
    Ele era um bicho esquisito
    Pequeno e miúdo e tão feio que só podia ser um desses micóbrios
    Micóbrio?
    (Vai ver que é parente de cocodrilo.)

    Micó...cró...có...cró...bio

    Era um micróbio sim
    Um bicho difícil até de enxergar
    Com uma calça blue jeans
    Um bicho difícil até de explicar
    Meia de lã, um lenço de cetim
    E de repente ficou olhando pra mim
    Com uma cara de choro que dava dó
    Sem falar no susto que eu levei
    Quando ele abriu a boca e disse:

    Ele me disse que ele era muito triste
    E que dançava mesmo só pra aparecer
    E era feio, careca, baixinho e muito barrigudo

    E chorava.... ave maria!
    Soluçava, gemia
    Inacreditável!
    Tão inacreditável que fui ficando desconfiado.
    Ôpa!
    Ele tava querendo me enganar
    (Será que ele queria te pegar?)
    Ah! Então eu esmaguei o bicho num pirex
    E deixei ele pregado na parede com uma fita durex.

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  2. Não conhecíamos essa música. Mas tem uma antiga do grande Cartola, "Fiz por você o que pude", que num determinado verso: "Jesus me premeia". Outros versos do cancioneiro popular brasileiro exploram com ironia ou singeleza os tropeços na língua: "A gente somos inútil" (em "Inútil", do Ultraje a Rigor), ou "Eu vou de liforme branco, eu vou" (em Maracangalha, de Dorival Caymmi).

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  3. Pra não falarmos de toda a obra do "mestre singelo", Adoniran Barbosa, né?

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  4. E o que dizer então das famosas chamadas da GloboNews, GNT e congêneres: aos 15 minutos da madrugada de sábado para domingo. Só mesmo na tv globo é que tem madrugada de um dia para o outro.

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