sábado, 16 de julho de 2011

2046 – Segredos do Amor

Muita coisa fica rodeando a cabeça destes tiranídeos, como que pedindo pra se concretizar como pauta. Sacou?! Aqui não há um poder absoluto que parte de mim ou da Fátima. Pensamentos e lances de dados têm algo em comum. Ou incomum. Isso é que é bom, porque quando o assunto se intromete e bate duro, adeus sinuca de bico. É só abrir espaço para a bola da vez.

O cinema do chinês Wong Kar-wai, o grande esteta do cinema mundial moderno, na opinião deste humilde escrevinhador, que pensa e sabe que não conhece tudo sobre cinema (graças a Deus); cai como uma luva. “2046 – Segredos do Amor” (2004) nos hipnotizou nesta noite 15/16. Acompanho o trabalho desse cineasta há vários anos e conheço um punhado de seus filmes. Adoro-os. Acho que sua produção fílmica beira a perfeição neste mundo fragmentado, que necessita de requisitos potentes para conquistar o público. À primeira vista, não é o que este filme oferece.


Paciência. É a palavra chave pra se deleitar com a magia de Wong Kar-wai. A narrativa é arrastada, lenta. Os filmes de arte gozam dessa prerrogativa. Não são películas que entram por uma retina e saem pela outra. Estabelecem-se em algum lugar da nossa memória e se enraízam. Acostumei-me com isso. Arte que é arte pra valer, pensando bem, mais incomoda do que diverte. Diversão tem mais a ver com entretenimento e não é este o caso.




Uma história de amor centrada num personagem canastrão (com  bigode a la Clark Gable [chinês com cinismo de canto de boca e ainda com bigodinho!] deve ter sido o vento que levou esse mustache ralo lá pros lados orientais). Ele é um escritor fanfarrão, conquistador e discreto, se é que é possível combinar essas características. Está às voltas com uma obra que lhe vai surgindo, ambientada no ano de 2046, que também é o número do quarto de um hotel barato, objeto do seu desejo, onde mora. Envolve-se com diferentes mulheres, achando que estará sempre imune ao amor. Sujeito ingênuo.  




O filme tem uma narrativa literária. Salta pra lá e pra cá, oscilando entre a vida do escritor e a sua ficção. Claro que tudo vai se misturando... Onde já se viu uma obra contemporânea não se equilibrar na tênue linha que separa a realidade da ficção? As músicas belíssimas (latinas e americanas em ambiente tipicamente oriental dos anos 60), fotografia e cenário impecáveis, luz inebriante e personagens consistentes já bastariam. Mas ainda há a soberba direção do diretor chinês.




Esse filme é uma ode a vida de um homem. Um presente para comemorar o dia do homem. (todo dia é dia do homem e da mulher).  Um segredo só existe se for contado para um buraco, no tronco de árvore, e depois cerrá-lo com barro. Uma andróide que só consegue chorar horas depois de experimentar a emoção e sua lágrima é o vestígio da dor. Ensinamentos e reflexões que emanam da cinematografia deste mestre da sétima arte.


  



Um comentário:

  1. o bom desse filme do kar-wai é que ele funciona melhor depois que você assiste chunking express e, é claro, in the mood for love. outro que fez bem essa construção quebra-cabeça complementar na própria filmografia é tsai ming-liang. já viu algo desse cabra?

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