Hoje vamos deixar sangrar e cultuar duas referências cults da maior qualidade musical. E não é só de música que vivem esses dois monstros: poesia, teatro, literatura, artes plásticas e cinema. Leonard Cohen e Cida Moreira. Não, não se trata de nenhum show com os dois juntos e, infelizmente, é meio difícil isso acontecer. Mas, dá pra ouvir um, e depois o outro. É possível encontrar boas perfomances desse canadense e dessa brasileira no youtube. E na indústria fonográfica também há disponibilidade de trabalhos dessa dupla, separadamente.
Na pequena, mas valiosa coleção de gravações do lar Tyrannus, temos o documentário "Leonard Cohen: “I'm your man” (2005), e um especial com Cida Moreira. Os dois são porretas demais. I'm your man" assistimos trocentas vezes, enquanto Cida, gravamos há poucos dias e já vimos e revimos.
"Vamos falar sério: há pouquíssimas pessoas que chegam ao nível de Leonard Cohen. É um talento muito, muito raro. Por mais sombrio que ele seja com relação à democracia e ao futuro, ele faz algo belo na escuridão... Muitos de nós nos sentiríamos pequenos diante do que ele joga fora", diz o vocalista Bono, do U2, no doc sobre Cohen. Não cabe aqui reproduzir a trajetória do poeta, compositor e cantor que nasceu em 1934 em Montreal. Só uma pista: sua obra tem uma relação muito afinada com o movimento punk.
O filme é uma colagem de muitas coisas em torno de Cohen, mas tem como linha mestra um show tributo realizado em Sidney, na Austrália. Trechos de entrevistas com ele, com artistas que participaram do show, desenhos de Cohen e outros preciosos cacos vão surgindo no documentário, que tem direção e roteiro de Lian Lunson. Participam artistas como Nick Cave, Rufus Wainwright, Linda Thompson, Beth Orton, The Handson Family, Jarvis Cocker, Antony, Julie Christensen e Perla Batalla. "Eu me senti o maioral porque descobri um cara que me separava das outras pessoas e das coisas que eu detestava", diz em tom confessional Nick Cave, sobre sua primeira audição de Cohen, quando morava numa pequena cidade australiana.
Nick Cave |
O que impressiona em Leonard é a sua bela voz gravíssima e a poesia generosa que transborda em suas canções. Ele é pouco conhecido, porém, pelo menos uma de suas músicas, "Halleluja", você já deve ter ouvido. Integrou a trilha sonora do filme alemão Edukators (2003). Não conhece? Então repare num dos episódios da animação muito popular, "Shrek", onde o hit de Cohen também rola. "Para mim, Leonard é o homem que, já tendo conversado com os anjos, desce da montanha com as tábuas de pedra", declara despudoradamente o enigmático Edge, do U2. Resumindo, é preciso seguir os mandamentos de mister Cohen, pois ele, é o cara.
A dama Cida Moreira, resguardadas as proporções, é que nem Cohen. Pelo talento que tem e pelo currículo, deveria ser mais reconhecida e valorizada. Nasceu em São Paulo, em 1951. É impressionante como Cida imprime originalidade em suas interpretações, que pescam os mais variados autores da música universal. O especial tem a direção de Fernando Faro. Bastante intimista, como convém à cantora, traz belas canções com sua voz de tessitura incrível - dos graves aos agudos, sem dificuldades. Há, ainda, respostas dela à algumas perguntas de alguém que está bem próximo, mas não se sabe quem é e tampouco ouve-se a sua voz.
Ela começou sua carreira em 1977, atuando como atriz de teatro em musicais. "Eu queria era aparecer mesmo", diz ela, despojadamente, em uma de suas falas. E confessa no final: "Eu poderia dedicar a minha vida inteira a dois músicos: Kurt Weill e Chico Buarque". Atenta, atentíssima ao que rola na música através dos tempos, Cida entoa, neste musical, compositores como Vicente Celestino, Amy Winehouse, Lamartine Babo etc... É pra babar mesmo, com suas interpretações.
Cida e o véio Hélio Flanders |
"Cantar Tom Waits é como acariciar arame farpado", registra ela, na carona da frase de um jornalista a respeito do grande artista americano, antes de cantar "Time". "Surabaya Johnny", de Kurt Weill, com letra de Bertold Brecht, é outra canção que está no programa.
Brecht no repertório de Cida |
Sendo só o que se apresenta para o momento, salve Cida e viva Cohen!
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