terça-feira, 26 de julho de 2011

Vida crítica

(*)
Hoje a gente vai descer o pau. Vida de crítico, não é mole. É porrada que não acaba mais. A última a querer dar porrada foi a atriz Antonia Fontenelle (esposa do diretor Marcos Paulo) que, ao se deparar com a crítica de Pablo Villaça, sobre o “Assalto ao Banco Central”, não resistiu e tuitou: “Gente quem é Pablo Villaça? Essa pessoa se intitula crítico, tem cara de cearense, percebi que ele quer 5 minutos de fama”. Constrangimento total. Tentaram remendar o soneto, mais a merda foi parar no ventilador. Preconceito a “la brasileira” é assim que funciona, bate e assopra. E o que os “cearenses” tinham com a história... ah, sim, a atriz disse que adora os cearenses e que tem um que trabalha no filme que é fofo.


Às vezes uma crítica publicada (aí já é pública) não converge para o gosto do leitor, espectador de cinema/teatro/TV, gourmet. E aí? Bom, quem escreve uma crítica, acreditamos que tenha predileção e conhecimento sobre o assunto. A opinião, não deveria ser encarada como ofensa. Até porque ninguém é o dono da verdade.

Pablo Villaça "infiltrado"
A crítica é uma prática que deveria ser democrática. A crítica é uma característica da filosofia, ela examina os princípios, a aplicabilidade na vida, inconsistências e só aceita quando, após uma análise crítica, não há qualquer razão para os rejeitar. A dona filosofia, como sempre, jogando sua luz sobre a complexidade humana e as criações que dela surgem.


Roger Ebert
O crítico de cinema Roger Ebert escreve para mais de 200 jornais, é autor de 15 livros e tornou-se o primeiro crítico de cinema a receber o Premio Pulitzer da Crítica. Eber diz que muita gente não sabe o que significa ser crítico, que as pessoas acham que o crítico é uma pessoa que critica, que são desagradáveis, ciumentos, cansados e amargos, que querem parecer superior a todos os outros, que são impossíveis de agradar, que não entendem o gosto das pessoas comuns, que gostam de arrasar o trabalho dos outros, porque não podem e não conseguem fazê-lo, então criticam. O mundo seria melhor sem eles.


O filme “Crime Delicado” (2005) dirigido por Beto Brant, baseado no livro homônimo de Sergio Sant’Anna, conta a história de um crítico teatral que se apaixona por uma atriz de teatro, que é apaixonada e musa de um pintor. A moça nada convencional, não possui uma das pernas, desperta paixão pelo cínico e frio jornalista. O ator Marco Ricca, na pele desse personagem, encarna um crítico que vive às voltas com seus fantasmas e pesadelos, massacrado pela complexa função.




Ter um chilique por conta de uma crítica negativa é comum no meio artístico. Assisti a um show do Caetano no Rio, em Madureira, há muitos anos. Ele tinha sido alvo de comentários nada elogiosos de um jornalista do JB. De repente, no meio do show, Cae para de tocar e diz pra plateia: “acho o Jornal do Brasil uma bosta”.


Aqui em Cuiabá o pensamento e a prática do texto crítico passam ao largo. Até mesmo as resenhas, que ousaremos definir aqui como críticas simplificadas e que se resumem mais numa opinião pessoal, são algo raro de se ver na imprensa. Essa é uma enorme lacuna no contexto da cadeia cultural mato-grossense.


* Tinhorão
Em 2005 participei de um evento sobre jornalismo cultural. Maurício Kubrusly e JB Medeiros estavam entre os convidados. Conversei bastante com o Medeiros e ele me disse que é imprescindível a figura do crítico em qualquer meio cultural. Narrei-lhe das dificuldades de se fazer crítica numa cidade ainda com moldes provincianos, como Cuiabá, já que o crítico profissional não deve ter relações com os criadores do objeto de seus textos. Ele me olhou bem nos olhos e disse algo mais suave do que um “foda-se”, mas com o mesmo significado.


O crítico animado Anton Ego

Para muitos o discurso do crítico gastronômico, Anton Ego, personagem da animação Ratatouille, condena e absolve o crítico: “De várias maneiras, o trabalho de um crítico é fácil. Nós arriscamos muito pouco e, a despeito disso, desfrutamos de uma vantagem sobre aqueles que submetem seu trabalho, e a si próprios, ao nosso julgamento. Nós nos refestelamos escrevendo crítica negativa, que é divertida de escrever e de ler. Mas a verdade amarga que nós, críticos, temos que encarar é o fato de que, no grande esquema das coisas, até o lixo medíocre tem mais significado do que a nossa crítica assim o designando. Mas há momentos em que um crítico verdadeiramente arrisca algo, e isso ocorre na descoberta e na defesa do novo. O mundo é muitas vezes cruel para novos talentos, novas criações, novos amigos, necessidades. Nem todo mundo pode se tornar um grande artista, mas um grande artista pode vir de qualquer lugar”.

Um comentário: