sábado, 30 de junho de 2012

Overdose

Galera overdosada
Overdose acontece quando há uma exposição a doses excessivas. Pode ocorrer de forma acidental ou provocada. É difícil estabelecer o limite entre estas duas situações. A overdose se dá quando o usuário busca insanamente consumir mais e mais, até perder o controle. Garantimos: ninguém sai imune de uma over. Conosco não podia ser diferente.


Lambe lambe, não, Lang Lang. E nenhum parentesco com Fritz Lang. A mais expressiva novidade da música erudita moderna, o pianista chinês Lang Lang. Muito inspirados vimos um concerto do grande artista na telinha, uma performance bastante teatral, com Beethoven, Albeniz e Chopin no repertório. Assim começou a over the dose de erudição. Aranhas caranguejeiras acasalando. É por aí que o pensamento viaja quando estamos hipnotizados pelas suas ágeis mãos, destrinchando o piano.




Aos dois anos, após assistir Tom e Jerry, com o gato tocando Liszt, ele se interessou pelo instrumento. E assim começou essa carreira espetacular. A marcação cerrada do pai, personalidade musical, na preparação do filho foi, digamos, ao estilo oriental. Certa vez, por causa de um atraso para os estudos, em casa, o pai sugeriu que ele se suicidasse ingerindo um punhado de comprimidos. Coisa de louco! Já sua mãe recomenda até hoje, ao jovem de 29 anos, quando sai para as noitadas: “Filho, não volte tarde pra casa. Amanhã você tem que acordar cedo”.




O pianista pop star também recebe duras críticas. O povo chinês não entende como ele faz sucesso se não participa e não ganha nas competições. No ocidente os mais conservadores não gostam de sua postura e o chamam de J-Lo do piano. Incontestável é que o cara é um virtuose e puro carisma. É ídolo global, embaixador da Unesco, e bancado pela Adidas e pela Telefónica. O “efeito Lang Lang” aconteceu após a abertura das olimpíadas, em Pequim. Uma nova revolução cultural na China. A informação é que provocou uma corrida para estudar piano naquele país: só 40 milhões de chinezinhos!


Jaroussky assim como o Lang Lang é toceira

Mas Lang era pouco. Precisávamos de mais e mais... fomos em busca de Philippe Jaroussky, cantor lírico francês. Quantos cantores líricos devem existir na França... A questão é que Jaroussky é contratenor, quase um soprano - voz feminina, emitida por um homem. Ele nasceu em 1978 e é um dos contratenores mais requisitados. No concerto que vimos Jaroussky é acompanhado por uma orquestra de câmera, em Berlim, solta a voz num repertório barroco.

Músicas dos tempos em que às mulheres era proibido cantar dentro das igrejas. Alguns homens, então, que cantavam com bela voz quando jovens, eram operados (castrados mesmo!), para manter a voz masculina numa altura em que só as mulheres conseguiam cantar. Mas a saga dos “castrati” (assim eram chamados) acabou faz tempo. Vivemos numa época mais civilizada onde se buscam os contratenores por excelência.



Lang Lang e Philip Jarowsky nos chaparam. Por causa dessa overdose de música clássica de alta qualidade tivemos um efeito colateral. No cair da tarde, trafegando pela Avenida das Torres, pintou uma coisa estranha, uma música surgiu do nada. Uma consequência, talvez... Sei lá. E nos pegamos cantando uma velha canção, do Paulo Diniz... “outro dia vinha pela rua, quase morri de rir, pois um cara que passou por mim, chorava fazendo assim...”. Que coisa mais fora de hora. Ou não!   




E esta conversa precisa ser encerrada. Queremos mais... está no programa conferir um documentário sobre a montagem do balé “O canto do rouxinol”, do início do século XX, que reuniu Stravinsky, Matisse, Balanchine e Diaghilev, o dândi russo visionário, um dos maiores empreendedores culturais do mundo em todos os tempos.

Pega leve Diaghilev

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Sincretismo

Chega-nos a informação de que não se deve dizer “eu trabalho em casa”. Não soa bem profissionalmente. “My office home...” ou o meu escritório é na minha residência. Isto sim, é tido como correto. Ficamos preocupadíssimos com isso, por que desenvolver funções profissionais no ambiente doméstico é uma opção pra muitas pessoas. E estamos nessa. Aí, né... disseram também pra não usar essa expressão – “né”, quando se é entrevistado, melhor “hamm". Andam dizendo tanta coisa. Muita falação e pagação pras nossas cabeças.

As orientações acima são por conta do marketing pessoal. A “imagem” que passamos precisa ser positiva, inteligente, moderna, eficiente e outros blablablás. O valor da imagem é que ela pode ser manipulada, pode ser maquiada. Esconder um negocinho ruim aqui, e enaltecer uma pequena característica bacana. É assim que funciona. Enquanto a imagem é assim, a reputação, que na verdade é muito mais valiosa, essa, no frigir dos ovos, vai acompanhar a biografia das gentes importantes. O vip morre, mas sua má fama permanece. Às vezes, nem cristão perdoa. Agora, se for um simples mortal, que sorte. Nem todo mundo vai saber que o canalha foi tarde.

São Pedro

A vida passando lá fora e você isolado. Trancafiado no aconchego do seu lar, e ainda tendo que cuidar da sua imagem. Esquece isso, pelo amor de Deus e lembre-se das informações sobre a religiosidade brasileira que bombam na mídia neste final de semana. A notícia remete ao levantamento do censo do IBGE de 2010. Demorou... Católicos perdem espaço. Evangélicos, espíritas, seguidores do hinduísmo, do candomblé, do islamismo, de tradições indígenas e os sem religião ganham terreno. Procurada por uma emissora de TV pra falar sobre a pesquisa, a Igreja Católica empurrou com a barriga qualquer manifestação oficial. Estratégia muito usada no meio político. Falar o que?!

Chico Xavier


Ciência e religião se aproximam nestes tempos. Uma propaganda televisiva soltou essa, e não dá pra duvidar muito. Só um pouco. Às vezes fico matutando... querer entender demais sobre os mistérios que envolvem nossa existência é procurar encrenca. Ou será que é preguiça de pensar mais profundamente?  Deus me perdoe.


Tupã

Experiências espirituais, algo que necessariamente não precise ser religioso, pode ser apenas científico; entretanto, podem contribuir conosco para o entendimento da vida. Não há nenhuma razão explícita para se dizer isso, mas, vamos lá... que seja intuitivo. Ou religioso mesmo. Depende de cada um.


Iemanjá

Os aspectos extrafísicos do ser humano ainda dão pano pra muita manga. Esbarrei numa experiência desse gênero não faz horas. E lá na hora H fui inquirido se não gostaria de saber mais sobre minhas “outras vidas”, porque contribuiria para meu autoconhecimento. “Não, não quero não.” Ainda justifiquei dizendo que tenho problemas e coisa demais pra pensar sobre esta vida de agora. Não saberia explicar o real motivo pelo qual declinei dessa curiosa possibilidade, mas acho que foi algo mais ou menos assim: “Procuro ser uma pessoa do bem e levar uma vida relativamente tranquila nesta vida. Vai que fui um canalha numa outra existência”. 

"Os deuses devem estar loucos"

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Lenços


“Guardei seu lencinho pra me lembrar...“ . Eis um artigo em desuso total, demodê.  Já foi peça indispensável para os dois sexos. Os homens se valiam dessa pequena peça, geralmente branca, para enxugar o suor da testa, para soar o nariz (coisa nojenta), ou para oferecer as mulheres em situações intencionais e românticas.


Os lenços femininos eram de pouca serventia. Não ultrapassavam o status de alegóricos. Eram pequenos, de cambraia, com rendinhas, bordados, cheios de rococó. Eram usados para causar... puro charme e geralmente perfumados. Houve um tempo em que funcionavam como truque de sedução. Código. Deixá-lo cair perto de alguém do interesse era sinal para o gajo se aproximar.



Monograma


Em Portugal as moças bordavam lenços e entregavam para o pretendente e, se este usava-o em público, significava que era um sim. Coisa que a gente só viu em filme: o mocinho oferecer gentilmente o lenço pra mocinha enxugar as lágrimas (geralmente uma só). Algumas abusadas soavam o nariz e entregavam de volta o paninho melecado.


Não sabemos se eles têm algum parentesco com lençol. A grafia das palavras é semelhante em português. Os lenços são de tamanhos variados. Já falamos daqueles de bolso e os de toalete, mas também existem os famosos “carré” (quadrado em francês, 90X90 centímetros), com os quais as mulheres "resolvem" eventuais questões de suas cabeças. Lenços na cabeça, segundo consta, chegaram ao Brasil com a princesa Carlota Joaquina que, na viagem pra cá, foi acometida por uma infestação de piolhos e teve que usar e abusar deles. Lançou a moda.

O mais famoso: Hermès




Os homens também já usaram lenço na cabeça. Disfarçaram adotando o nome de bandana. Alguns jogadores de futebol chegaram a usar e era algo tão ridículo que pode ser comparado ao penteado do Neymar. Pra completar essa estranheza estética convém lembrar das pochetes. Aqueles cintos com uma bolsinha que eram indumentária obrigatória dos policiais federais, na década de 80.

Liu Arruda, gente simples daqui usava lenço

Dona Florinda, põe lenço por favor!


Os lenços, ainda no terreno masculino, já tiveram função enganadora. Ou de disfarce. Em filmes de faroeste os bandidos cobriam o rosto com lenços para não serem reconhecidos. Hummm... tá! Os mágicos, acredite se quiser, esses profissionais da ilusão, usavam e ainda usam essa peça pra refinar o figurino e pra fazer aqueles números pra lá de conhecidos.




Cavendish e corsários em Paris: guardanapo em vez de lenço

Os gaúchos, povo brasileiro sempre meio atípico, tradicionalmente, usam lenços no pescoço e de cores diferentes, para indicar preferências por esse ou aquele caudilho; enquanto os americanos, nos anos 70 e 80, usavam lenços de cores variadas e em bolsos de diferentes lados, para indicar suas opções homossexuais. Nada de associar a tradição gaúcha com os “toques” dos gringos, pois estará praticando homofobia.




Aqui neste blog combatemos todo e qualquer tipo de preconceito. Coisa fora de moda neste mundo moderno, que nem o lenço. Mas, em caso de preconceito, use o lenço contra essa pessoa. Mordaça nela!!!

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Meia boca

Dia de final de Libertadores, torcida organizada no Tyrannus. O Coringão é o Brasil nesse certame. Da parte de um tricolor de coração, cabe esquecer a história: “torço pra dois times, pro Fluminense e pro time que está jogando contra o Corinthians”. Vale tudo até aceitar o pedido (humilde) pra usar a camisa nova do Flu, que deu sorte no domingo passado.
 

Cervejota rolando. Planos de petiscar uma linguiça com cebola, pimentão e tomate, no capricho. Uma boquinha. Quem vai fritar hoje não é o Timão. Oxalá, o Boca. Porque se depender dos preparativos... estamos concentrados, já entramos em campo, tamo até batendo uma bolinha! Tem até bombons.


Bombons fora de foco
 
Lugar de bombons é na bombonière. Bomboneira é outro papo. É o incrível estádio de Buenos Aires. Campo minado. E registre-se que o Corinthians tá jogando melhor e os caras, pra variar, tão provocando. E é assim que estamos fazendo o post de hoje. Ele vai brotando aos poucos. Alguns parágrafos antes do início do jogo. Faz de conta que é um texto ao vivo, em tempo real.




 
É difícil não saber o resultado quando o Corinthians tá jogando. Se não tem fogos, vai mal, se tem foguetório, podes crer que o Coringão tá de boa.  Daqui a pouco, mais um pedaço deste post, retratando nossa abalizada opinião sobre o primeiro tempo da partida. E está proibido mexer nesta parte do texto depois que o jogo começar.
 
Terminou o primeiro tempo 0X0, a retranca tá dura! O time brasileiro com a defesa indevassável. Tá difícil pro Boca enfiar uma bola. O Emerson, principal atacante do Timão, tá louco pra enfiar a mão na cara do argentino com "pelos largos". Vamos aguardar. Vai dar Curintians, pode crer! Pensando bem, esse placar até que tá de bom tamanho. E vai começar o segundo tempo.





Bola rolando e o Boca vem pra cima. A situação do Timão oscila entre difícil e desconfortável. Passa o tempo, vem uma bola na área do time brasileiro e a finalização é na trave. Nem dá tempo de ouvir aquele uuhhhh... na rebarba da bola na trave, vem o gol do inimigo, o Boca, aos 29 minutos. Jogar na bomboneira não é brincadeira. Puxa vida... vai empatar. O ataque do Corinthians, sabemos todos, não é grande coisa. Mas...





Desespero total. Olha ai, é o Romarinho aquecendo, o técnico resolve apostar nele mais uma vez. Afinal, no domingo passado ele botou duas bolas, no Porco. E vem o ataque do timão, puro rolo compressor. Emerson passa a bola pro Romarinho, é sua estreia na Libertadores, é a primeira bola na Libertadores e ele chuta com categoria. É golllllllll do Curintians! A torcida do Boca tá de boca fechada. O jogo termina 1 a 1. Salve o Corinthians!!!


Qué passa?




terça-feira, 26 de junho de 2012

Tulpan

Vem lá do Cazaquistão a nossa mais recente conquista cinematográfica. Ficamos hipnotizados, olhos grudadinhos na tela apreciando “Tulpan” (2008), filme encantador e inusitado, já que não é todo dia que nos deparamos com o cenário e o cotidiano das áridas terras desse país tão estranho e distante para nós brasileiros.


O jovem Asa retorna ao seu local de origem, as estepes do Cazaquistão, após servir a marinha. Ele quer/precisa arrumar uma esposa para ter seu próprio rebanho de ovelhas, tornando-se um pastor errante naquela região desértica. Achar uma noiva por ali não é nada fácil, mas seu problema maior é que a única que encontra recusa-o por achá-lo orelhudo.







E nesse drama que tem pretensões de romance desenvolve-se a história de Asa, o personagem de orelhas grandes. “Encostado” na humilde residência de sua irmã, e com seu cunhado o olhando meio enviesado, o jovem casamenteiro sofre com as agruras que o destino lhe preparou. Tem um único amigo que o ampara, mas que tenta convencê-lo a ir para a cidade e mudar de vida.





O diretor casaq, Sergey Dvortsevoy, não precisou de muitos personagens para produzir seu filme. Explorou a paisagem desolada da região, e camelos, cavalos, cães e muitas... muitas ovelhas; para compor e movimentar seu ambiente fílmico. O elenco, composto por uma única atriz profissional e todos os outros são (eram) pessoas comuns, passou um tempo vivendo junto antes do começo das filmagens.


Askhat Kuchinchirekoo, Samal Yeslyamova e Sergey Dvortsevoy

 
O fato de não contar com atores profissionais em nada compromete a obra. Todos os atores mostram-se muito a vontade na pele de nômades. As relações entre os familiares onde Asa está agregado é muito curiosa e às vezes engraçada. As crianças, seus sobrinhos, iluminam as cenas quando aparecem, e estão sempre presentes: a menina canta o tempo todo, o filho mais velho ouve as noticias no rádio e reporta detalhadamente à noite ao pai, e o pequeno, um garotinho de poucos anos, se movimenta na aridez do quintal de sua morada sobre um cavalo imaginário – algo tipo um cabo de vassoura.





O filme demorou quatro anos para ser concluído, mas depois de pronto saiu colecionando prêmios pelo mundo (Prix no Um Certain Regard do Festival de Cannes, melhor filme no Festival de Londres, melhor filme no Festival de Zurique e melhor realizador no Festival Internacional de Cinema de Tóquio).


Cada detalhe de Tulpan que, aliás, é o nome da possível noiva de Asa, soma muito para o resultado final que deu num filme delicado e sensível, o que contrasta bastante com o ambiente onde foi filmado. A sugestão está feita e, por favor, aqueles que assistirem, fiquem espertos para ver se conseguem ver Tulpan, não o filme, mas a moça por quem Asa se apaixonou. Quanto a nós, apaixonados, pelo filme.



segunda-feira, 25 de junho de 2012

Dublê de voz

Filme dublado ou legendado? Preferimos com legendas. Não tem nada a ver com nossos conhecimentos idiomáticos. Estamos longe de dominar a língua inglesa, alemã, francesa, espanhola... Embora nos safemos em caso de apuro ou de sobrevivência na selva. Aquele inglês. Nesse caso, uma tecla SAP... Vixi... danou-se!


As legendas, em nossa discreta opinião, influenciam menos, negativamente, na autenticidade do filme. A dublagem, não. É uma violência no aspecto interpretativo/sonoro da obra. Pra quem achar um exagero, tudo bem... é uma violência consentida. Esse repúdio em relação à dublagem nos coloca em mais uma minoria. E, nos últimos quatro anos, essa minoria diminuiu ainda mais, já que cresceu a opção por filmes dublados.

Essa preferência tem se acentuado ao ponto de nem ser necessária uma pesquisa. Os administradores dos cinemas simplesmente repararam nisso e oferecem mais e mais projeções dubladas, para atender à demanda.


Meg Ryan em Harry e Sally: como dublar um orgasmo

Para os mais exigentes a dublagem não cola mesmo. Mas não é apenas a questão de um filme estrangeiro ter seus personagens falando em português. Passamos por uma situação estranha ao assistir um filme que discorria sobre o final da vida do escritor russo Leon Tolstói, em inglês! A língua russa é muito sonora e única. Tudo bem que Christopher Plummer e Helen Mirren no elenco amenizaram, mas, faltou a língua mãe do autor de Guerra e Paz. Por isso, pecou.

Jean Hagen dublada por Debbie Reynolds em "Cantando na Chuva"


Será que é coisa de gente metida a intelectual? É engraçado que na França e na Espanha, onde a população certamente é mais intelectualizada, os filmes legendados são exceção. Eles preferem os dublados, porque valoriza a língua pátria e também favorece o mercado da dublagem.
 
Houve um tempo em que nas dublagens brasileiras a voz de velhos e de crianças parecia ser sempre as mesmas. E é do Brasil o dublador na ativa mais velho do planeta, o famoso Orlando Drummond, mais conhecido como “Seo Peru”, personagem da Escolinha do Professor Raimundo. “Está comigo porraqui”.


"Está comigo porraqui"

Não dá pra negar que o cotidiano de um estúdio de dublagem é algo muito curioso. Remete às antigas novelas de rádio. Os dubladores ficam ali emparelhados mandando ver seus textos e diálogos, com suas vozes carregadas de emoção, drama, humor... Verdadeiros artistas da voz.





E também é inegável que um filme legendado rouba preciosos instantes de uma plateia que, em vez de se preocupar com a legenda, bem que poderia estar atenta na fotografia, no trabalho dos atores, na luz etc. Convém acreditar que adicionar vozes em outro idioma aos personagens de filmes vem evoluindo e há muito talento nessa história.
 
Mas vozes como a de Don Vito Corleone, interpretado por Marlon Brando, em “O Poderoso Chefão”, são praticamente insubstituíveis. Dublar o grande artista que encarnou um personagem dessa magnitude é uma missão impossível além de ser uma afronta.

domingo, 24 de junho de 2012

Nada

Elenco de "Nada"
Mas, que nada. Nadica de nada e foi-se o meu trauma com o teatro. Aquele medo de ter vontade de sair no meio da encenação e a atitude pegar mal. De magoar os atores, o diretor ou mesmo alguém da plateia. Certo terror que me persegue há tempos, e que só vai embora quando assisto uma peça até o final e saio feliz da vida. “Nada”, dramaturgia nascida a partir de grande ídolo, Manoel de Barros, foi “culpada” por essa agradável situação.

Eu diria que não tem começo, nem fim. Mas isso não interessa. Não compromete. As coisas lineares é que são um pé no saco de vez em quando. E que estranho... nada, um nome que tem muito conteúdo. Nunca me senti tão a vontade. Saí querendo assistir novamente.




Não morri de rir e nem chorei. A performance teatral produziu-me emoções a conta-gotas. Bela mão a dos irmãos Guimarães, dupla brasiliense que vem se destacando no cenário da dramaturgia brasileira nos últimos anos. Assisti, no arrojado espaço cultural da Oi Futuro, no Flamengo.

E depois de me imiscuir na ambiência humana que gera a poesia fértil de Manoel de Barros, o Nequinho, poeta pantaneiro; muito me instiga o resultado da Conferência Rio+20 que acaba de terminar e que ficou muito aquém do esperado. Ficou devendo, paciência. Reforço que acredito muito mais em poesias e nos artistas, do que em governantes e governanças.

(Foto: José Medeiros)

(Foto: José Medeiros)
Na direção além dos manos Guimarães, mais uma mulher, também assinava. Ao entrar no teatro me deparo com uma japonesa que estava numa pose de mestre de cerimônia e lhe pergunto: “É você que também dirige?”. “Não sou nada”. “Sou nada”, também caberia. As poucas cadeiras destinadas à plateia circundam o espaço cênico. Sete atores, ao todo, se misturam com o público. Uma mesa central e uns poucos milhares de peças de vidro de tamanho variado compõem o cenário. Surpreendo-me, a encenação já tá rolando.

Fernando e Adriano Guimarães (Foto: Dinah Feitoza/CEDOC)

É uma festa. Aniversário de 80 anos do patriarca da família. Todos os personagens, com a mais absurda naturalidade, estão perfeitamente encaixados em seus papéis. Não há declamações, mas os versos filosóficos do poeta vão surgindo como cacos ao longo texto, que resgata a experiência humana no lento e arrastado ambiente pantaneiro. Flagro-me rindo por dentro, por ser conhecedor das coisas comuns ao pantanal, e achar que estou em vantagem em relação às demais pessoas que assistem à encenação.

A grandiosidade de Manoel de Barros se dá na conjunção dos detalhes de seus versos e a força imagética que eles contêm. Minha memória é avivada e o imaginário provocado a cada minuto. Há momentos em que esqueço que estou numa peça... estou numa festa de aniversário. Quitutes e bebidas são servidos e uma velha vitrola enseja a trilha sonora que traz, entre outros, a arrebatada Helena Meirelles. Entretido com a encenação, nem percebo os 90 minutos passarem.



(Foto: José Medeiros)
                          http://josemedeirosimagem.wordpress.com

Certifico-me que a peça terminou mesmo, feliz da vida. Adoro teatro. Tenho certeza de que meu trauma com a arte de representar está superado. Pelo menos até pintar a próxima peça! Terminamos o post nos deliciando com os últimos minutos do filme “Milagre de Santa Luzia”. Mais Pantanal...