sexta-feira, 17 de junho de 2011

Mal entendido


Foi um mal entendido... Existe coisa pior? Um mal entendido pode causar desastres inimagináveis, crimes horrendos, destruição de lares, rompimentos dolorosos, perdas de amigos, frustações imensas, guerras, raivas e assim por diante. Quem nunca passou por isso? Acredito que em algum momento da vida passamos ou passaremos, porque é fácil de acontecer: um momento de distração, de falta de atenção, de achar que sabe, que entendeu ou conhece, uma leitura incompleta, um desligar precipitado do telefone, um interromper de fala...

Mal entendido é chato na hora, mas depois tende a ser cômico. Já protagonizei muitos, com essa mania minha de dar bom dia a cavalo e ser meio falastrão. Sobrevivi a todos. Uma vez, na Flip, com meu inglês precário, solicitei uma foto de um escritor francês convidado e ele foi super gentil. Ao final, claro, achei que era hora de expor minha fraqueza na língua shakespeariana e, em vez de dizer good luck, disse good look... O cara ficou me olhando de uma forma meio estranha.


Grégoirie Boulier, good look mesmo!

Somos protagonistas de mal entendidos quando geramos a situação, ou seja, quando fazemos uma má interpretação, quando erramos, não entendemos, não compreendemos e nos expomos publicamente. Acontece quando fazemos juízo de valor, quando não temos pleno domínio sobre o que queremos demonstrar. Esse erro pode provocar críticas ferozes, dependendo do nível de stress. Protagonizamos, ainda, quando nós não somos entendidos. Quando a nossa mensagem não foi apreendida e, pior são colocadas como nossas; palavras, opiniões e interpretações equivocadas. É injusto quando somos vitimados por causa de um mal entendido. Mas muitas situações são irreversíveis. 

Às vezes, somos meros coadjuvantes, mas isso em nada atenua a nossa participação na construção desse engodo.

Em meados dos anos 90 eu já militava no jornalismo cultural e fui cobrir um evento, num hotel chique da cidade (hoje lá é o Deville), uma espécie de seminário sobre relacionamentos humanos. Naqueles tempos, apesar de não ser um foquinha, eu tinha mania de querer contemporizar as coisas. Assisti  uma palestra do Flavio Gikovate, onde ele tripudiou em torno das relações amorosas daqueles anos. Ao final, fui entrevistá-lo e disse-lhe dessa minha interpretação branda (pra não dizer equivocada) das suas palavras. Resultado: levei um homérico esporro público. Mas valeu. Comecei a perder a mania de querer contemporizar.


Conversando com estauta?

A história da humanidade, assim como a nossa, infelizmente, são repletas de mal entendidos e, também de centenas de perdões. Mas não há como remediar depois da cicuta servida e sorvida. Como resgatar a vítima da pena, depois de executada a condenação, por se crer que é a Terra que gira em torno do Sol e não o contrário? Meus mal entendidos e meus maus entendidos pessoais, são sofridos. Reservo-me o direito de não me perdoar, tampouco, aceitar desculpas (na maioria das vezes). Uma coisa é certa: o mal entendido acontece porque aquilo que julgamos importante não o é para o outro.

Rosivaldo Sena, jornalista jurássico, que nem eu, me contou de grande mal entendido que protagonizou. Era um final de tarde, aquela correria pra fechar a edição e ele foi informado que uma ‘autoridade’ tinha vindo ao jornal e queria falar com ele. Estava atarantado e disse que não queria atender ninguém. Pô, tava na hora daquele embate feroz contra o tempo, coitado do Rosivaldo. E disseram-lhe novamente da presença do figurão. Ele desabafou e xingou. Algo mais ou menos assim: “Porra, não vou atender ninguém agora”, bradou. Fez-se um silêncio sepulcral na redação e ele percebeu. Olhou para trás e o visitante inconveniente estava bem atrás dele. “Pois não, estou aqui pra ouvir o que o senhor tem a dizer...”

Por isso muito cuidado... Somos e estamos sempre vulneráveis. Qualquer um pode vir a passar por essa situação constrangedora ou vexaminosa: uma mensagem escrita (uma vírgula, um ponto fora do lugar... danou-se!), na oralidade, nas atitudes, nas situações, nas posturas (cuidado ao tirar fotos, uma imagem vale mais que 1000 palavras). Tudo pode ser mal entendido, mal interpretado, principalmente quando há certa predisposição.


Em 1944, Alberto Camus escreveu a peça teatral “O Mal Entendido” que tornou-se uma das obras precursoras do Teatro do Absurdo. A peça narra a história de duas mulheres, mãe e filha, que matam os viajantes que recebem em sua mansão isolada. Uma está cansada de tantas mortes e outra revoltada com seu destino, sem amor. Elas não reconhecem e matam um viajante que era o filho e irmão que, há 20 anos, havia partido e retornava para resgatar sua identidade.

A obra de Camus não é extensa, mas mostra a desesperança da condição humana, que pode ser resumida, na frase de Calígula: “Os homens morrem e não são felizes”.








5 comentários:

  1. Lorenzo de auréola... Até Drummond curtiu! A foto não poderá ser refeita, por que a roda foi pro brejo.

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  2. Falha nossa!!! o crédito da foto bacana é da Valéria Del cueto.

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  3. O melhor é mesmo no final quando fica tudo muito engraçado. Vamos à FLIP DE NOVO ????

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  4. O melhor mesmo é no final quando a gente pode rir.
    Vamos à FLIP este ano?

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