quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Nos anos 80 e 90 morou em Cuiabá Bené Fonteles. Sujeito definido como “artivista”, expressão que combina artista com ativista político, neste caso, atividades com apelo ambiental. Bené estará hoje no Sesc Arsenal, para participar de uma armação denominada “Conversa com Bené”. Além desse papo, acontece a exibição de duas peças audiovisuais: “Pedras sobre Pedras”, que tem música de Egberto Gismonti; e “Cozinheiro do Tempo”, documentário de André Luiz de Oliveira, com 52 minutos, que lança um olhar sobre a obra e a vida de Bené; com muita poesia. No doc amigos e admiradores do artivista como Gilberto Gil, José Roberto Aguilar, Gismonti e Arnaldo Antunes, entre muitos outros.
Bené está radicado em Brasília e deve reencontrar muitos amigos em Cuiabá. Sua passagem por aqui nos remete a um tema “saboroso” para se desenvolver. Pegamos carona no título do documentário sobre o artista e nos inspiramos para emplacar nossas costumeiras divagações e digressões em torno da palavra cozinheiro.


Palavra/função cujo significado extrapola a literalidade, mas nunca consegue se livrar do conceito original que expressa, já que, afinal de contas, cozinhar é preparar algo que gera expectativas agradáveis. Então né, sem o menor esforço e na ponta da língua da memória, um filme e um livro primorosos pedem passagem pra fluir no Tyrannus: “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante” (1989), dirigido por Peter Greenaway; e “O perfeito cozinheiro das almas deste mundo” (1992), livro gerado a partir do espólio do genial Oswald de Andrade.




Peter Greenaway, quase pintor

É muito reducionista classificar o britânico Peter Greenaway como simplesmente cineasta, embora o rótulo de multimídia, que lhe serve, seja banalizador nestes tempos onde o pós moderno já bailou. A sofisticação do cinema de Greenaway, certamente, advém de sua erudição e de seus conhecimentos de arte. Quando criança, desejou ser pintor, mas descambou mesmo pro cinema. Neste “Cozinheiro...”, o diretor conta a sua história no título da obra. Helen Mirren, Michael Gambon, Alan Howard e Richard Bohringer encarnam personagens exóticos e exuberantes nesta película cheio de imagens e cores espetaculares. As imagens magníficas contam com o apoio de Jean-Paul Gaultier. A trilha sonora de Michael Nyman também tem seu peso, e muito. O Cozinheiro..., na verdade, não é um filme só pra assistir. É coisa pra se ter gravada e rever sempre que possível. Arte sofisticada.

Oswald por Tarsila
Nos anos de 1918 e 1919, o espevitado Oswald de Andrade, tocou uma garçonnière, no centro de São Paulo. Nesse local, frequentado por artistas e intelectuais, surgiu um diário coletivo onde muitos escreviam, caricaturavam, rabiscavam, enfim, pintavam o sete. Tudo isso ficou guardado num grande caderno de capa dura com duzentas páginas, revelando intimidades, cartas, recados, colagens e outros cacarecos artísticos e literários de muita gente que ouriçava e agitava naquele point da rua Líbero Badaró. Parte dessa pacoteira está compilada em “O perfeito cozinheiro das almas deste mundo” (Editora Globo). “Uma pré-história textual oswaldiana”, sentenciou Haroldo de Campos sobre a obra. Assim como o ‘cozinheiro’ de Greenaway, este, de Oswald, é coisa rara e boa de se ter guardada em casa, com carinho.


E a receita de hoje expirou.

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