segunda-feira, 20 de agosto de 2012

La sangre brota


Se Nelson estivesse vivo - o Rodrigues, teria completado cem anos ontem. Um dos mais notáveis homens das letras brasileiras não precisou de um século pra nos chapar com suas histórias. Não sei por quê, justo eu, logo eu, que nunca percorri as academias, já andei dizendo que Nelson Rodrigues é o Shakespeare brasileiro. Seus personagens e respectivas famílias representam uma espécie de superlativo das estranhezas da sociedade brasileira. 

Tivemos que viver mais de meio século acreditando que tudo em torno do ser humano e suas relações (familiar, conjugal e extra, amizades...) estão no conjunto da obra de Nelson. Um autor que colocou sua inteligência e sua habilidade com as palavras para retratar as anomalias que não ousamos aceitar, mas que existem, existem! E aí vem um filme e balança nossa certeza. Certezas, sob determinado ponto de vista, são que nem paradigmas. Existem para se arrebentar. 


"Eu não aguento mais ver filme argentino bom, quando não, excelente!". Disse alguém aqui em casa, após assistirmos "La sangre brota" (2008), uma produção Franco-alemã. O retrato nu e cru de uma família classe média (média baixa, vá lá) da bela Buenos Ayres é mostrado com uma câmera nervosa, dando a sensação de que a tragédia está rondando cada um dos personagens. Um filme estarrecedor, daqueles que nos fazem engolir a seco, uma lágrima que desejaria escorrer. Uma história visceral narrada de forma isenta, sem pecado ou perdão. Um feladaputa esse diretor Pablo Fendrik, que nos joga esse filme na cara, como se estivesse a dizer: "se virem com ele".

Nahuel Pérez Biscayart e Ailín Salas 

Para arrebatar nossos sentimentos o cineasta também se vale da fotografia com enquadramentos evasivos e cores quase artificiais, que se contrapõem à naturalidade exercida pelo elenco em seu desempenho. Aquele conhecido truque de histórias paralelas que se entrecruzam e às vezes entram em rota de colisão funciona que é uma beleza. Uma obra dramática e tensa, cheia de intenções que desafiam o raciocínio do espectador embasbacado.

Arturo Goetz

Em entrevista, Fendrik disse que filmes bons são aqueles que não deixam quem assiste indiferente.  "Os filmes precisam ser intensos, e não aqueles em que o espectador sai do cinema dizendo apenas: que linda fotografia".   Se não for impossível, pelo menos, é muito difícil escapar impune, ou imune, diante deste filme.  

Pablo Fendrik

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